CONSIDERAÇÕES

PARA A FUNDAÇÃO DE UMA
CONVERGÊNCIA LACANIANA DE PSICANÁLISE

Por
   Luiz-Olyntho Telles da Silva





Organizar um espaço como o que pretendemos nos coloca em uma situação difícil: até agora temos ocupado o lugar do crítico, e sabemos o quão raramente o crítico passa ao lugar do escritor.

Quer nos parecer que é a uma passagem deste tipo que estamos nos propondo.

Queremos um espaço que não siga os moldes da igreja, nem do exército, nisto estamos todos de acordo. Sabemos o que não queremos e este já é um passo importante.

Por outro lado, o fato de o que queremos não existir nos coloca no campo da criação e, como criadores, estamos pisando na margem do futuro, fato que por si só faz emergir a questão da ética: o futuro que teremos, nós e nossos filhos, depende do que fizermos hoje. Somos fideicomissários de Freud e Lacan, e como tais precisamos ter sempre presente a questão da formação dos analistas. Mas isto não é falar de como ensinar psicanálise para principiantes; trata-se antes de ter sempre presente a questão da formação dos analistas que nós somos! A transmissão da psicanálise se dá enquanto praticamos nosso trabalho e o mittere aí presente é da ordem do ato.

Nossa presença em torno a instituição de uma Convergência é o testemunho de nossa inconformidade com a situação vigente, mas é também o testemunho de que a última palavra ainda não foi dita. Ainda temos muito trabalho pela frente. E isto diz também da presença de um desejo vigoroso.

Sabemos que a institucionalização da psicanálise serve de obstáculo ao desejo, nos referimos a este desejo que move o discurso da psicanálise. Se este não é o pivô das dificuldades, certamente é um de seus pontos importantes..

Os mais de dez anos da Lacanoamericana têm nos ensinado o enriquecedor que pode vir a ser uma estrutura onde o fulcro é constituído pelo trabalho de cada um e pelo respeito ao trabalho do outro. Esta estrutura determina uma horizontalidade abrangente cujas ondulações são conseqüência das diferenças de discurso.

Se por um lado é verdade que a característica de não continuidade, marcada pela dissolução ao final de cada reunião, concorre para a inexistência de uma estrutura hierárquica, por outro é verdade também que muitos laços de trabalho iniciados nestes encontros têm perdurado, e ao que isto aponta é a uma comunidade de trabalho.

Pensamos que isto nos encoraja a tentar a formalização de um espaço para esta comunidade de trabalho a qual nos possibilite capitalizar estas conquistas, uma vez que a fragmentação que temos vivido até agora muito não tem nos ajudado.

Assim é que temos pensado para Convergência uma estrutura organizativa mínima, que respeite antes de mais nada a soberania das instituições que a conformam e garantem, vale dizer uma estrutura que respeite as diferenças, uma estrutura que nos permita mesmo navegar na diferença.

No Brasil que conhecemos não nos tem sido fácil navegar na diferença. As tentativas feitas não tem alcançado a reciprocidade necessária à sua continuidade. É preciso ainda mais trabalho, supomos, para que se alcance ao respeito necessário ao desejo de trabalhar juntos. Isto equivale a dizer que estamos inteiramente de acordo com a realização de comissões de enlace regionais, mas não podemos esquecer que esta regionalidade, antes de ser ditada pela geografia, é ditada pela transferência, condição de existência do inconsciente de cujo conceito faz parte o analista.

A Comissão de Enlace Geral deve ser mantida – com uma rotação regular de seus membros – por sua característica de lugar da representação. É possível mesmo que esta seja a estrutura mínima que todos queremos, lugar que pode dar cabida e extensão às iniciativas de cada instituição.

Desta Comissão de Enlace Geral poderia sair uma publicação mensal com as atividades desenvolvidas pelas instituições convergentes, ou seja, atividades envolvendo pelo menos duas instituições.

O informe n.º 2 da Comissão Organizadora da Reunião Fundacional, prevista para outubro deste ano, nos fala de 50 instituições interessadas nesta fundação. Isto significa que desde a Reunião Preparatória tivemos um aumento de cerca de 50%. Crescerá geometricamente a cada ano? – Estamos de acordo que é preciso pensar em um dispositivo que possibilite a entrada destas novas instituições. O critério de uma apresentação referendada por quatro instituições já convergentes, como requisito para ser aprovada por uma maioria simples, nos parece adequado. Além disto, deveríamos ter como critério básico o exame da constituição estatutária das instituições demandantes, no sentido de estarem eles conformes aos propósitos de convergência e às leis de seu país de origem.

A participação de psicanalistas não-associados nos trabalhos propostos pelas instituições convergentes, como jornadas de trabalho, publicações e mesmo um congresso geral, deverá ser sempre possível, não tendo contudo, de forma coerente com seus propósitos pessoais, direito a voto.

Quanto ao nome de batismo, não vemos porque não seguir com este bem teorizado e que carinhosamente já utilizamos: CONVERGÊNCIA LACANIANA DE PSICANÁLISE.

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